quarta-feira, 18 de junho de 2008

Escravas letras



Desejo aqui falar de muitas coisas
Mas tão muitas são essas que acabo no vazio
Desse papel, que faz tudo o que eu quero: pinta
Meu pensamento, dispõe-se sempre, e permanece
Para, na hora do meu brilhante auge de poesia,
não haver desperdício e dó.

Assim é a vida das letras:
Elas são material de construção de alguma obra,
Iluminadas de sentimentos e vontade de ser feliz.
Escravas de qualquer inspiração, sofrem mandamento
Das mesmas coisas de todos os dias,
E sempre diferente do dia passado.

Mas também não são coisas muito sérias
Como tais metáforas.
As letras não têm alimento,
E por isso aceitam qualquer lápis:
Aquele que tem como tinta lágrimas,
Aquele que escreve por pura diversão
E aqueles que inventam qualquer besteira
Para ela continuar viva, em forma de arte,
De descanso e sede de leitura.

A letra não tem culpa de existir;
A culpa é toda dos fatos,
Que dão continuidade à nossa vida passada
E dona de eternos adjetivos.

Vida vagabunda não compensa;
Te dissipa sem você trabalhar.
Meu deus, existe atividade mais feia
Do que essa de ver que o mundo
Anda e mesmo assim não andar com ele?

E quando eu chego perto dessa situação
Logo corro pra varanda
E varro qualquer livro literário,
Dicionário ou a gramática
Pra não me incluir nos homens de conforto,
Que não estão errados
Mas também não têm a aventura
De conhecer o que ainda não conhece.

É assim que se faz qualquer coisa boba,
que no final se torna bonito.
Na verdade é meio engraçado,
pois o direito é todo meu e o bom mesmo .

É que eu não falo pela letra,
mas a letra fala por mim.
Eu não tenho culpa de produzi-las de qualquer modo,
Como estou a produzir agora,
Sem nenhuma preocupação.
Portanto, não se preocupe, mesmo se
Você tiver nessa situação na qual estou:
Escreva a escrava.
Aqui não existe abolição das letras.

Fábio Coelho (2006)

Um comentário:

luna disse...

"É que eu não falo pela letra,
mas a letra fala por mim."
aaaa, ameii! eu tbm achoo!
vc fez um pensamento periférico, contornou tudo aquilo que centralizamos na nossa mente.. como é complexo certas coisas, ou como tornamos-as complexas..
a letra aceita tudo mesmo, desde desabafos, besteiras, coisas escritas com alma.. entre outros!
adorei! ;)