domingo, 13 de março de 2011

Asas


Acordo.
E o mundo já vem com sua bandeja.
Nela alguém está sorrindo para mim,
com braços abertos, sempre feliz.
É a liberdade.
E hoje? O que queres fazer?
Queres ser o que hoje?
Temos fantasias diversas,
infinitas, na verdade.
Temos atitudes: benevolentes, caridosas!
Ou será que nesse lindo dia
tu estás grilado com o mundo?
A liberdade é ousada, me pirraça
com sua tolerância de sempre,
sua abertura para tudo.
Me condena no final do dia,
dizendo que eu poderia ter sido outra coisa
naquele dia,
que eu não soube usar o silêncio meu
na hora que devia ter ficado calado.
Me condena na hora de dormir,
porque eu fiquei confuso
sobre o que fazer e como fazer
apesar daquela bandeja,
em que a minha liberdade estava,
em que estava um menu esbanjadíssimo, gordo,
um menu amigo e legal, como um pai adolescente,
o menu que todo presidiário e que todo moribundo
queria ter.
Ser livre agoniza.
Quando eu entro num carro com os amigos
o oxigênio rarefeito do ar condicionado vem me prendendo,
me fechando, justamente por ser rarefeito.
Então eu não sei se devo ser isso ou aquilo:
um carpinteiro do universo, carismático e adorado,
ou o cara mais insuportável possível,
porque quem é reto é enfadonho,
e, além do mais, para todo cara legal
existe um dia cinza, de crise,
que é quando o herói vira vilão
sem que ninguém entenda o porquê.
Sou um pássaro.
Entre o certo e o errado existe um horizonte.
Lá eu estou, e namoro os dois lados,
namorico bobo: não sei quem é um, nem outro,
namoro o certo e o errado, os dois,
porque morro de medo de ficar só com um,
ou só com outro.
Sem um, o outro não tem forma, conceito, sentido
e o outro sem o um não existe.
O segredo todo mundo sabe:
não há comparação havendo só um.
É preciso haver o certo para reprimir
e é preciso haver o errado para haver o certo.
Mas a minha asa grande voa sobre o certo e o errado.
Eu lá no horizonte, entre os dois,
e a minha liberdade lá em cima, voando com a minha asa
(a liberdade é a própria asa),
olhando os dois, apagando-os da minha visão.
A agonia de novo.
Minha asa me diz um consolo que não adianta nada:
O que posso eu fazer? Viver é obrigatório,
se você não pediu para nascer...
A culpa não é minha, garotinho.
Penso: errar é humano! Fico aliviado.
Mas não posso pensar muito nisso
porque fico com medo de fazer o mal-feito,
sabendo de sua gravidade
e que depois é só pedir perdão, não tem problema.
Errar é humano.
Ah, como eu gosto da minha asa!
Voo com ela sem medo de nada,
com a respiração limpa, temerária e ávida.
Ávida de só viver.
Mas depois tudo passa
e a hora da satisfação está longe.
E eu vôo, o mais rápido possível
para buscá-la, buscar essa hora.
Quando estou perto, perto,
me lembro de que estou voando,
estou com as asas, é a liberdade
que oferece todos os menus,
cobrindo meu horizonte todo de infinitos menus
com opções novas surgindo a cada instante.
E eu...
Que queria ser livre um dia.

Fábio Campos Coelho 13.03.11

3 comentários:

Tiago Alexandre disse...

Caramba, Mascote, que poesia mais linda é essa?!?! Arrancou suspiros do Dunguinha aqui.
Eu pensei que conhecia essa poesia, quando você me falou no dia do show do cover dos novos Baianos, mas na verdade eu confundi, não conhecia ainda. Essa poesia é linda por demais! Muito interessante a maneira que você tratou a liberdade. Ela é encantadora e perigosa. Existem dois lados nisso tudo. Você expôs com maestria, meu chefe! Tua poesia reinou. Essa já faz parte da minha lista de poesias favoritas da vida, dos mundos, dos infinitos, dos planetas e do universo. Linda demais! Peço sua permissão pra eu poder tirar uma xerox e guardar na minha carteira. Parabéns, Bin. Vejo que preciso frequentar mais o teu blog, tem coisas lindas por demais aqui! Abraço do Dunguinha.

Nanda disse...

Essa foi demais pra mim. Virei sua fã agora. Esse é com toda a certeza um dos poemas mais lindos que eu já li na vida. Sério mesmo! "A liberdade causa náusea" como diria Sartre - e essa é uma das frases que eu mais gosto! Destrinchar a palavra liberdade é um dos exercícios que de vez em quando me pego fazendo... e com esse seu poema, você simplesmente colocou a liberdade sob um holofote para mim. "Ser livre agoniza." - Minha nossa senhora, você é sensibilidade pura! Não só por tudo o que absorvi dessas poesias tão lindas, mas pela maneira com que você escreve...
Peço permissão pra puxar a cadeira, porque com certeza eu vou visitar esse seu blog muito ainda!

Parabéns, menininho.

Nanda disse...

Só mais uma coisa:

POEMA LINDO DA PORRA!

pronto, desabafei!
Sério... essa tua poesia está indo imediatamente para a categoria "Preferidas da Nandinas".
Acho que morri por uns segundos fugazes!

Um abraço, senhor.