sábado, 28 de março de 2009

Querida pelos errantes pensadores


Ela é a força motriz para a pouca ética que existe em minha pessoa, porque é no silêncio e escuridão da madrugada que se vê os defeitos ocultos e camuflados pela claridade e barulho do cotidiano. A escuridão dá a claridade para as resoluções e descobertas feitas pelo homem, pois quando os olhos estão tapados, ele descobre coisas que, se estivesse na claridade, não conseguiria descobrir. A claridade do dia impede à visão perceber os detalhes mais mascarados, aqueles pormenores perceptíveis apenas quando se está sozinho e concentrado; a noite não, pelo contrário, ela nos mostra as mais gigantescas desilusões que o conforto do dia não mostra. Conversar com um amigo, querendo diminuir a culpa de si, é fácil; um papo confortável e consolador sempre nos salva das podridões que temos, mas à noite não se tem ninguém para contorcer o significado verdadeiro dos erros, é você contra você mesmo. Portanto é ela que regenera a personalidade de quem pensa muito. Ingênuo e coitado é aquele que dorme. Obrigado, insônia, por existir.


Fábio Campos Coelho (29.03.09)

sábado, 14 de março de 2009

Inspiração da revolta


Há muito tempo quando fui à Brasília
O povo de lá me falava que goiano
Não tinha abertura pra se expressar
Porque o sotaque não soava tão bem
Quanto o catarro que sai do R candango.

Para falar a verdade eu nunca aceitava
A teoria de que só valia a intelectualidade
Garantida no sotaque que nenhum caipira
Saque como um paulista ou um gaúcho.

Eu puxo, puxo sim a porta e o portão
Mas não ouço bem o chiado do carioca
Que soca no pastel e na castanha que
Todo nordestino tanto adora.

E os cearenses, com suas cabeças chatas
E preocupadas com a recepção dos turistas,
Admiradores das lindas praias e saias
Usadas pelas negras do bumbum
Cuja curva não se encontra em mais lugar nenhum.

E depois os tais turistas falam mal do nordeste
Depois de ter sentado nas cadeirinhas
Passando os pés nas areias lindas
E levantando as suas mãozinhas naquela preguiça
Para mais uma água de côco.


Observe, absorve e tenha calma,
Que ainda tem muita filosofia
Entre a simpatia e o cerne da alma.


03.10.07

quarta-feira, 11 de março de 2009

Existencialismo


__A morte, então, seria o nada, a ausência plena de significado para o homem. Por que então temer, meu filho? Por quê? Pois assim, de olhos fechados para sempre, não se sente mais nada. Então o medo é de não sentir mais nada? Pense bem... Se Deus existe mesmo, independentemente do que Ele seja, não projetaria sua vida para que na morte você sofresse, não é verdade? É por isso que eu falo, menino, que você não precisa ter medo: nenhum morto nunca queixou da dor que tem de sê-lo.
__Mas pai, eu não descordo em nada do que você me disse; e assim, mesmo assim eu tenho medo. A gente nunca sabe o que vai acontecer. Viver no céu ou no inferno para sempre... Me dá agonia só de pensar nisso.
__Não precisa ter agonia. Olhe bem, filho! Ouça bem o seu pai. Existe uma verdade, existe; uma verdade que a gente não sabe. E aquilo que tem de acontecer vai acontecer. Por isso, não se pode mudar essa regra. Essa, infelizmente, é a única que não pode ser mudada. Só Deus pode mudar, filho! Só Deus!
__Mas então, se Deus vê tanta gente chorando por causa de pai, de mãe que já morreu, por que ele não muda? Por que ele pelo menos não faz um esforço?
__Esforço, filho? Deus não precisa de esforço para mudar qualquer coisa. Ele é o criador de tudo, dos fenômenos, da física, da alegria e da madeira. Se ele quisesse mudar, já teria mudado há muito tempo, ou até então teria feito um sistema diferente de vida e morte.
__Será? Eu fico pensando... Eu fico pensando... E se não existisse Deus, pai? Quem faria o mundo, o tempo, a os homens e tudo que existe?
__Não tem dessa, filho. Deus sempre existiu. E sempre vai existir, entenda isso.
__Olha, eu vou te falar uma coisa, mesmo se você me contestar depois. É que eu não acredito em Deus, às vezes, sabe pai? Eu fico olhando as crianças comendo lixo, naquela miséria impressionante e depois eu olho para o prédio onde eu moro, esse prédio cheio de conforto. A criança não tem culpa de ser pobre, ela já nasceu na desgraça. Por que Deus deu tristeza a ela e isso tudo a mim? Se Deus existe, ele é injusto, pelo menos disso eu tenho a certeza.
__Filho, deixa eu te perguntar uma coisa: Você já viu o vento?
__Já.
__E você já viu a cor do vento, filho? Me diz. Você já viu se o vento é amarelo, vermelho ou azul?
__Não.
__Pois então, é a mesma coisa. Só me faça um favor: nunca duvide Dele, filho. Ele é a nossa razão, foi Ele quem me criou, você, seu avô. Tudo.
__Está bem, eu não duvido mais.
__Presta atenção. Eu também já fiquei horas e horas pensando sobre isso, se Ele existe ou não, se ele é injusto com alguns, mas não tem solução, filho. Não adianta. Portanto, tenha fé, pois se ele realmente existir e você não acreditar, pode acontecer muita coisa ruim depois da sua morte. É melhor respeitar a existência dele, filho, me ouça.
__Certo, pai, certo. Eu não duvidarei mais de nada, afinal sou apenas um menino.
__Agora vai dormir, filho. Amanhã você tem aula e tem de acordar cedo.
__É, eu vou dormir mesmo.
__Boa noite, durma com Deus.
__Boa noite, pai, amém.

O menino dorme. Tem um sonho. Aparece um corpo com cabeças incontáveis, mais de um milhão de cabeças, bem mais, ligadas a só um pescoço. O garoto percebeu que algumas deles ele conhecia. Uma cabeça era da sua professora de geografia, outra era de uma menina com quem havia se trombado no supermercado há pouco tempo, havia a face do seu irmãozinho que acabara de nascer. Então esse corpo com infinitas cabeças lhe disse:
__Você é um menino inteligente, gostei de você, garoto.
__Por quê? Quem é você?
__Quer saber mesmo quem eu sou?
__Quero, me fale. Quem é você?
__Não fique assustado com o que eu vou falar.
__Eu estou ficando com medo de você.
__Isso. Você acertou.
__Acertei o quê?
__Você acertou, eu sou o Medo. Meu nome é Medo, mas alguns me chamam de Deus.

Fábio Campos Coelho (11.03.09)

sábado, 7 de março de 2009

Frases de mulher


Eu nunca fiquei com homem casado
Tenho dignidade, nunca fui mulher indecente
Como muita gente fala por aí.

Mas não escapei da rede dos enganadores
Daqueles que compram amores
Com poesia, palavra bonita e flores.

Eu nunca mais falo com você, cafajeste
Seu ridículo, sua peste, pensei
Que pelo menos fosse amigo.
E se eu for embora, fique sabendo
Desde agora que os filhos ficarão comigo.

Hoje não penso em casamento
Mas tenho sempre firme o pensamento:
Aos trinta quero me ver casada
Mulher que não casa não tem moral
Não tem felicidade, é mal amada!

Olha, netinho, nunca bata em sua mulher
Você nunca viu seu avô batendo em mim.
Não importa, seja o que ela fizer:
Quebrar prato, talher, destruir a harmonia
Mas se encostar a mão, não tem perdão:
Direto pra delegacia!

Homem desgraçado, vou me vingar, pode crê
Vou sair na rua, com saia curta, cheirosa
Gostosa, com meu cabelão, quase nua
Ele vai se arrepender.

Se ele não me deu valor
Eu também não tenho obrigação de amar
Vai ver agora o que merece
Vai rezar, chorar, fazer prece pra eu voltar.

Que mulher ridícula aquela
Fez escândalo no elevador
Quebrou a portaria, xingou o zelador
E queria que eu descontasse
Mas não faço isso, sou mulher de classe.

Fábio Campos Coelho (07.03.09)

quinta-feira, 5 de março de 2009

Me diga o que devo sentir


A ilusão de qualquer mortal,
Mesmo sendo animal racional,
É pensar que, depois de muita experiência,
De estudar filosofia, literatura, a ciência,
Haverá fórmula concreta de como pensar.

Mas é tudo mentira esse bafafá
Mascarado pela aparência de maturidade
Pois mesmo com muita idade
A querida humanidade ainda erra
Coletivamente ou em particular.

Me diz, Deus, ao pobre mortal aqui
Como devo sentir depois disso tudo
Depois dessa eterna busca pela moral,
O princípio da educação e piedade.

Porque na confusa sociedade
Não se sabe qual é o sentimento
A ser priorizado ou se não existe
Essa bobeira de priorizar coisa nenhuma
Já que a vovó fala ao netinho
Que é pra ele pensar mais em si.

Me diga o que devo sentir
Quando chego ao bar
E ver o cotidiano de rir às quintas.

Mas seria mais agradável
Você me dizer, na hora de dormir
Em tom saciável: Não sintas.