quando nem me dava por gente
tentaram me ensinaram a rimar
mas eu não conseguia,
a professora debochava e ria
e o que apenas dizia:
Tente!
Era tão difícil, puro sacrifício.
O vocabulário indigno, vergonhoso
não me sugeria nada,
metrificação desorientada,
Parnasianismo seria uma latada.
Cadê o gozo?
Mas fui crescendo, lendo e lendo,
estratégia de garoto sagaz.
Dicionário muito usado, fato estupendo,
deixei a ignorância pra trás.
Cultivava Bilac e a sua rigidez,
fazia agora requinte, redondilha maior
Tudo metrificado, e no dia seguinte
gostava de ver que ali tinha suor.
Mas um dia a minha empregada me salvou
Me salvou sabe de quê? Da perfeição:
Binho, vai procurar a ração!
Acho que está na instante do quartinho
Mas por favor, procura com carinho
e dedicação.
Fuçei, fuçei, fucei
Olhava de parte em parte,
mas infelizmente não achei.
Só que lá no fundo, lá no fundo
tinha um livro desses
sujos de poeira e soltos pelo mundo.
Um livro de poesias de um tal mineiro,
um cara magro, de óculos,
com a cara concentrada não sei em quê!
Sentei no banquinho da dispensa
e li uma, duas...
Na terceira poesia percebi
que ele não tinha o requisito
que a minha professora achava
que todo poeta tinha de ter.
O mineiro não rimava,
ele não tinha requisito...
mas mandava bem a mensagem.
Muito esquisito, tinha algo de errado!
Alguma coisa me dizia:
Amigo, sai dessa de rima,
dê a volta por cima.
Você tem que se ligar é no recado!
De tanto me ligar da moral das mensagens
Eu fiz uma, mas fiz direito:
Não Tome como parâmetro de competência
A profissão de um sujeito.
Assim também é com a estética:
O que muda o recado
se é professora ou doméstica?
Se não houver mais perfeição aqui
não venha falar comigo.
Vá brigar com aquele cara
que nem sabe, mas é meu amigo,
o cúmulo da espontaneidade,
sujeito mineiro de Itabira
que surpreendeu o goiano caipira:
Carlos Drummond de Andrade.
Fábio Coelho (29.07.09)
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